Declaração da ANEEL sobre revisão das regras de geração distribuída aquece discussão em torno desse modelo e de outras alternativas ao consumidor.
O mercado livre de energia é um ambiente em que o consumidor negocia o preço da sua energia diretamente com os agentes geradores e comercializadores. Dessa forma, o cliente livre pode escolher qual será o seu fornecedor de energia. É uma opção ao chamado mercado cativo, ou regulado, no qual se encontra a maioria dos consumidores residenciais, atendidos pelas distribuidoras que possuem concessão para vender energia nas diversas regiões do país.
Para migrar ao mercado livre, é necessário atingir um consumo mínimo mensal de energia, que é de 0,5 MW. Aos consumidores que não atingem essa marca, há uma outra alternativa, que é a geração distribuída (GD). Ela apresenta benefícios como redução de custos e geração por fontes renováveis, permitindo a comercialização do excedente de energia produzido.
As tarifas de energia do Brasil estão entre as mais caras do mundo. Assim, a GD tem sido vista como uma via para redução do valor das faturas. Quando a quantidade de energia gerada em determinado mês for superior à energia consumida naquele período, o consumidor fica com créditos, com validade de 60 meses, para abater valores da conta de luz da unidade em que está localizada a central geradora, ou de outras unidades remotas, se pertencerem ao mesmo usuário e forem atendidas pela mesma concessionária.
No entanto, a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), no dia 10 de fevereiro, ao se posicionar favorável à GD no Brasil, indicou que cabe ao governo ou ao Congresso Nacional decidir sobre alterações nas regras do sistema de compensação de créditos da GD. A ANEEL defende que a Resolução 482, que busca permitir o avanço e o desenvolvimento sustentável da GD, sofra revisão independentemente da agência reguladora, por se tratar de uma política pública. Dessa forma, o subsídio a quem opta pela GD pode sofrer alterações.
No final de 2019, a ANEEL iniciou uma consulta pública para revisão da Resolução 482, que recebeu mais de três mil contribuições. A ocasião desencadeou uma campanha de agentes do setor que acreditam que mudanças nas regras atuais podem inviabilizar a continuidade do crescimento da utilização da fonte solar em telhados e propriedades de consumidores de energia. O tema, também conhecido como “taxação do sol”, tem sido alvo de muitas discussões.
Para além do debate acerca das regras para GD, é preciso entender como funciona de fato essa opção, bem como o mercado livre de energia, pois a escolha sobre qual modelo utilizar gera dúvidas aos consumidores. As duas alternativas têm suas vantagens, mas é preciso observar os critérios relativos a cada uma delas, bem como as exigências do processo de migração para o modelo escolhido. A escolha deve levar em consideração o consumo mensal de energia, os gastos com a conta de luz, a incidência de raios solares e de ventos na região, a estrutura de GD disponível na cidade e, principalmente, os objetivos do consumidor.
O mercado livre é um ambiente de negócios em que as operações são reguladas por acordos firmados diretamente entre usuário e fornecedor do serviço. É indicado a grandes consumidores, como shoppings, supermercados e hotéis, além de indústrias de pequeno e médio porte. O principal benefício do modelo é a redução de custos, já que a energia é adquirida diretamente do fornecedor, fazendo com que o preço seja mais atrativo. Possibilita negociações de contratos, preços e taxas, e ainda estimula a competitividade e, por consequência, a qualidade do que é oferecido. E o consumidor ainda passa a ter mais controle sobre seus gastos com energia elétrica, já que o valor pago fica definido por contrato, com prazo estipulado.
Já a GD é produzida pelo agente no próprio local do consumo, ou em lugar próximo. A produção de energia se dá por meio de pequenas centrais geradoras, movidas a fontes renováveis, como a solar. Ao contrário do mercado livre, a produção se dá no ambiente de contratação regulada, estando as unidades conectadas à rede distribuidora, encarregada de emitir os pareceres de acesso para que as usinas operem, bem como os documentos relativos ao faturamento. A GD se tornou viável em 2012, a partir de uma resolução normativa da ANEEL, e passou por uma revisão em 2015, que propôs estímulos ao modelo devido aos benefícios que ele traz ao sistema elétrico.
Na GD, o consumidor fornece o excedente para a rede de distribuição de sua localidade. Ele pode ainda optar pelo autoconsumo remoto, que possibilita produzir energia em um imóvel e consumir os créditos em outro, desde que ambos estejam contemplados pela mesma concessionária. Esse modelo permite também a geração compartilhada, que possibilita que a unidade, onde está o sistema de GD compartilhe parte de seus créditos com outros consumidores, inclusive definindo o percentual de energia que será destinado a cada unidade. O consumidor também pode arrendar parte de sua usina e usar a geração dela para abater do seu consumo.
Segundo a ANEEL, existem hoje mais de 242 mil usinas em operação, que beneficiam cerca de 315 mil unidades consumidoras no país.
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Para migrar para o mercado livre de energia é necessário enviar uma carta denúncia à distribuidora da região, apresentando a intenção de rompimento do Contrato de Compra de Energia no Ambiente Regulado (CCER), respeitando a data limite de 180 dias antes do término da vigência. Uma das exigências para a migração é a necessidade de encaminhar as informações do consumo mensal para a Câmara de Comercialização de Energia Elétrica (CCEE). O processo é feito de forma eletrônica e é de responsabilidade da distribuidora pela qual o consumidor é atendido. Para que a distribuidora possa enviar esses dados é necessária a substituição do equipamento de medição de consumo elétrico que era utilizado para o mercado cativo e, em alguns casos, pode ser preciso adequar cabos e eletrodutos. Mais de 10 mil agentes já participam do mercado de comercialização de energia elétrica no Brasil e estão habilitados a negociar na CCEE. A marca foi alcançada em julho do ano passado.
Já um sistema de GD requer investimento na instalação local que vai gerar a energia e a ANEEL não estabelece o custo dos geradores, nem eventuais condições de financiamento. Assim, o consumidor deve analisar se vale a pena, avaliando os seguintes pontos: custo da geração, custo da instalação, localização para que a usina se conecte à rede de distribuição, valor do uso do fio da distribuidora, valor da tarifa referente à unidade, condições de pagamento e se existem outras unidades que possam usufruir dos créditos do sistema de compensação de energia elétrica.
Foram promovidas a Consulta Pública ANEEL n.º 25/2019 e a Audiência Pública ANEEL n.º 40/2019, que tiveram por objetivo a obtenção de contribuições para a minuta provisória de texto que visa alterar a Resolução 482, referente à GD. Nas ocasiões, o regulamento em elaboração foi alvo de críticas por se revelar contrário aos estímulos à GD e à autoprodução de energia. Também desconsiderava os principais benefícios decorrentes desse modelo, como a possibilidade de postergação de investimentos nos sistemas de distribuição e transmissão, bem como o alívio nas redes, o que contribui para o aumento da vida útil de equipamentos existentes ao longo de uma linha de transmissão. Em última instância, a proposta caminhava em direção oposta ao incentivo do uso de fontes renováveis de energia.
Esse histórico levou a ANEEL a defender, em fevereiro deste ano, que a Resolução 482 seja revisada como uma política pública, independente da agência reguladora. Assim, o subsídio que vinha sendo concedido para estimular a GD pode, ou não, ser retirado. O Congresso Nacional está envolvido com o tema, indo de encontro à predisposição anunciada pela ANEEL para que o assunto seja tratado via lei. A ANEEL deve aguardar que o Poder Legislativo aprove projeto de lei sobre a GD até o encerramento do primeiro trimestre de 2021. Caso contrário, a agência poderá publicar a minuta provisória de texto resultado da Audiência Pública n.º 001/2019, que pode comprometer inúmeros empreendimentos de geração em operação e em implantação.
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